O pagamento de benefícios previdenciários pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), sistema público que atende aos trabalhadores do setor privado, somou a marca inédita de R$ 577 bilhões nos sete primeiros meses deste ano, de acordo com números do Tesouro Nacional.
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O valor, que é recorde histórico para o período, ficou próximo dos R$ 600 bilhões.
A comparação histórica é possível porque os valores foram atualizados pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a inflação oficial.
Nos últimos três anos, o décimo terceiro dos aposentados foi antecipado e pago, de forma integral, ainda no primeiro semestre.
A previsão do governo, para todo este ano, feita em julho, é de que o pagamento de benefícios previdenciários somem R$ 923 bilhões, o que representará uma queda na comparação com o ano passado. Os valores foram corrigidos pela inflação para possibilitar uma comparação.
Analistas têm apontado que a projeção deste ano estaria subestimada pelo governo, mas o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que os gastos do ano de 2023 foram inflados pelo pagamento de precatórios atrasados pela gestão anterior, do ex-presidente Jair Bolsonaro — que aprovou uma PEC sobre o assunto. O que inflou os números do ano passado (base de comparação).
Para o ano de 2025, segundo números da proposta de Orçamento, os benefícios previdenciários, sem contar precatórios, avançarão R$ 71,1 bilhões, o que representa metade do aumento de R$ 143,9 bilhões do limite de crescimento das despesas discricionárias (gastos livres dos ministérios, que não são obrigatórios).
O que impulsiona o rombo previdenciário?
Segundo o Ministério do Planejamento, o rombo da Previdência Social (despesas acima das receitas) devera avançar de R$ 272,6 bilhões, em 2024, para R$ 293,5 bilhões em 2025. Na proporção com o PIB, o governo prevê que o déficit do INSS ficará estável em 2,37%.
De acordo com o economista Fabio Giambiagi, pesquisador associado do FGV IBRE, especialista em finanças públicas e previdência social, a política de aumento do salário mínimo acima da inflação, adotada pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), está pressionando o rombo do INSS. Isso porque, pelas regras atuais, o benefícios previdenciários não podem ser inferiores ao salário mínimo.
"Essa política para o salário mínimo é absolutamente insustentável ao longo do tempo. O que acontece é que o nosso país é vítima do curto prazo. Toda vez que você apresenta o orçamento, naquele ano o efeito do salário mínimo é modesto em uma despesa [total] de R$ 2 trilhões. Mas o efeito acumulado ao longo do tempo é brutal. São mais R$ 10 bilhões a R$ 15 bilhões que se adicionam por ano [aos gastos públicos]", afirmou Fabio Giambiagi, ao g1.
Para Giambiagi, uma estratégia mais drástica, de desvincular os benefícios previdenciários do salário mínimo, pode ser barrada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Por isso, ele defendeu a política anterior, adotada na gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro, sob o comando do então ministro da Economia, Paulo Guedes, com reajustes do salário mínimo somente pela inflação — sem aumento real — mantendo a vinculação com as aposentadorias.
"Eu não tenho dúvida que é isso que vai acontecer, não sei em que ano. Se houver mudança de governo, há boa chance de acontecer em 2027. Se o presidente [Lula] for reeleito, pode acontecer ou não. A conta no próximo governo vai aumentar muito", declarou Giambiagi.
Segundo o especialista, outro fator que tende a pressionar cada vez mais o déficit da Previdência Social são as mudanças demográficas identificadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), pelas quais os idosos deixaram de ser a menor fatia da população brasileira em 2023 e, daqui a duas décadas, vão ser a maior delas.
De acordo com o Instituto, os principais motivos para esse movimento são a queda na taxa de fecundidade (número de filhos por mulher) e o aumento da expectativa de vida.
"Estão nascendo cada vez menos crianças, com a queda da taxa de fecundidade. E esse processo está sendo mais acelerado do que se imaginava. Numero de 0 a 14 anos vai migrando para o número de adulto jovens. Isso acentua o desafio previdenciário", disse Giambiagi, explicando que haverá, no futuro, menos trabalhadores para "sustentar" a população idosa, aposentada.
Nova reforma à vista?
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A última reforma da Previdência foi feita em 2019, no primeiro ano do mandato do presidente Jair Bolsonaro, fixou uma idade mínima de aposentadoria (65 anos para homens e 62 anos para mulheres); regras de transição para o trabalhador ativo; e a média de todos os salários recebidos para o cálculo do benefício, entre outros pontos.
Com as mudanças, o antigo Ministério da Economia, comandado então por Paulo Guedes, estimou, em 2019, que a reforma teria um impacto potencial de reduzir o rombo previdenciário de R$ 800 bilhões a R$ 1,07 trilhão em dez anos.
De acordo com Fabio Giambiagi, os últimos números de crescimento do rombo previdenciário "certamente" indicam a necessidade de uma nova reforma da Previdência no futuro.
"Eu espero que não seja necessário esperar até 2031, digo 2031 porque a gente sabe que a reforma acontece sempre no início de governo, por razões obvias. Seria desejável para ocorrer em 2027 [no primeiro ano do próximo mandato], mas teria que ocorrer uma discussão prévia. A de 2019 teve um debate anterior, proposta por Temer", afirmou o economista.
No ano passado, analistas ouvidos pelo g1 já apontavam que a necessidade de uma nova reforma da Previdência Social.
"Imagino que esse governo segura [sem fazer uma nova reforma]. No limite, se não no próximo governo, em 2026, o eleito em 2030 vai ter de fazer isso. Pois o déficit vai começar a escalar, ou ele governa ou paga Previdência", declarou o economista Paulo Tafner, naquele momento.
O consultor de Orçamento da Câmara dos Deputados, Leonardo Rolim, ex-presidente do INSS e ex-secretário de Previdência no governo Bolsonaro, concordou que será necessário uma nova reforma da Previdência Social no futuro. "Imagino que na próxima década", afirmou, em 2023.