“Até que ponto somos capazes de lidar com o outro?”. Essa foi uma das questões-chave levantadas pelo professor e pesquisador João Carlos Correia, da Universidade Beira Interior (UBI), de Portugal, em participação no seminário “Cultura e o Outro”, promovido na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) pela rede internacional de pesquisa Multimundos.
Na ocasião, o intelectual apresentou o painel “A possibilidade ou impossibilidade do reconhecimento de outrem: Oswald Spengler e Samuel Huntington", em que propôs uma discussão sobre cultura, alteridade e identidade refletindo considerações de filósofos conservadores e defensores do nacionalismo. Alemão, Spengler, por exemplo, demonstrou ao longo da vida certa simpatia pelo nazismo e o britânico Huntington chegou a defender o direito à guerra como forma de preservação de ‘culturas superiores’.
O ressurgimento do nacionalismo pelo mundo foi refletido pelo professor português a partir do cenário de ascensão da ultradireita na Hungria e na Polônia, que contam atualmente com governos que declaram apoio a específicas identidades religiosas e possuem políticas contra imigrantes e refugiados.
Para o professor, o cenário de ataque violência contra minorias nesses países torna-se combustível para a eleição de candidatos e partidos xenófobos e autoritários graças à pouca disponibilidade dos indivíduos em lidar com a cultura do outro. Correia ainda considera semelhanças entre o quadro europeu e o brasileiro.
“Reparem uma coisa: as questões sobre imigração estão hoje no centro de praticamente todas as discussões políticas na Europa e nos EUA, e em certa maneira está muito presente no interior do espaço público brasileiro também. Mas toda a questão vai além da imigração. O fato do convívio entre pessoas que têm culturas e identidades diferentes ser possível tem sido constantemente questionado”, apontou o intelectual.
Intolerância e nostalgia
Em continuação, o português considera que para o cenário de intolerância, é necessária a suscitação de um sentimento de nostalgia, levantando questões como “precisamos ser grandes como antes”, justificativa recorrente entre os apoiadores do Brexit, a saída do Reino Unido da União Europeia que carrega consigo razões nacionalistas. No Brasil, a semelhança é guardada no saudosismo de parte da população com relação à Ditadura Militar que ignora a perseguição e os prejuízos causados pelo regime ao país.
João Carlos Correia ainda fez considerações sobre populismo e sobre a ‘diabolização’ de pautas progressistas, caras às minorias. Além disso, refletiu sobre o recorrente ataque à mídia como forma de enfraquecimento das democracias, sobre o alastramento do fenômeno das fake news e sobre o valor e as contribuições dos direitos humanos à sociedade.