“Ah! Ummm...”, “Tchá por Deus”, “Agora o quequeesse!”, “Chialá”. As expressões do linguajar cuiabano são a marca registrada do piadista "Boia Cuiabano", de 48 anos, que faz sucesso com vídeos para a sua página no Facebook.
Cuiabano de tchapa e cruz, José Antônio da Costa Bispo - seu verdadeiro nome - conta que o primeiro vídeo foi postado por acaso há quatro anos.
Dono de bom humor desde quando se entende por gente, Boia estava na delegacia resolvendo uma questão com a filha e se deparou com a prisão de um assaltante. Na mesma hora já tirou o celular do bolso e começou a fazer piada da situação. Ele diz que foi muito incentivado pela filha a postar o vídeo na rede social.
“Esse vídeo rodou e o pessoal gostou. Comecei a fazer vídeos e o pessoal de outras páginas compartilhava e pedia mais. Acharam legal. Então comecei a mandar os vídeos e tomar gosto”, relembra.
No entanto, somente em 2018 o humorista criou a página do Boia Cuiabano no Facebook. Ele também já tentou migrar para o YouTube, mas não conseguiu o mesmo alcance. Hoje, o piadista tem 12 mil seguidores na página oficial, já gravou mais de 100 vídeos e teve produção com cerca de 500 mil visualizações.
“Minha filha fez um canal no YouTube para mim e eu comecei a colocar lá, mas não dava visualização e parei de colocar. Eu faço mesmo no Facebook, onde já me conhecem”, afirma.
Já o apelido foi adquirido ainda criança. O humorista conta que, aos quatro anos de idade, os colegas passaram a chamá-lo de boia por conta da barriga avantajada.
Cuiabanês
O linguajar cuiabano nos vídeos não é algo forçado por Boia, como acontece com personagens do teatro da Capital. Foi como ele aprendeu quando dava suas primeiras palavras ainda na infância. “Na escola mesmo, a turma ria muito de mim, do meu linguajar, do meu sotaque.
Mas eu não importava”, revela. Apesar das críticas, o piadista tem orgulho das suas origens e reforça o sotaque sempre quando sai de Cuiabá para que não fiquem dúvidas de onde ele vem. “Meu linguajar é das antigas.
São as pessoas mais antigas que falam assim hoje. Fui criado em um meio que só falava assim. Quando vou viajar, eu ainda forço um pouco mais para a turma ver”, afirma José Antônio. "Eu estava em Barra do Garças e uma mulher me perguntou sobre o preço de um arroz e eu disse: 'Olha, não sou daqui.
Estou tchegando agora'. Ela falou: 'Você é cuiabano, né? Percebi pelo sotaque. Seja bem-vindo'”. José Antônio também repassou o cuiabanês para as filhas, porém elas também foram vítimas de deboche na escola. Segundo ele, as crianças apontavam que as meninas falavam errado. “Quando começaram a estudar na Fundação Bradesco, a turma começoua rir dizendo que elas falavam errado. Aí ela veio se queixar para mim. Falei: ‘você não fala errado, você fala o nosso sotaque. Você foi criada nesse meio e é assim que você fala’”, relembra. Hoje as filhas já não falam mais o cuiabanês, mas às vezes soltam algumas expressões próprias do linguajar e o peito do humorista se enche de orgulho. Boia lamenta que os jovens cuiabanos não reproduzam mais a fala característica. Para ele, é uma perda cultural enorme para Cuiabá.
Cenas do cotidiano
Boia Cuiabano tira sarro de panoramas do dia a dia da Capital de forma simples, inocente e até efêmera, mas somado à sua principal característica que é o cuiabanês. Assim ele conseguiu conquistar um vasto público. Boia não é apenas um personagem cuiabano “digoreste” – como ele define. O Boia é o próprio humorista como ele sempre foi. “Me falaram que eu tinha que me fantasiar também, fazer um personagem, mas não quero. Sou assim mesmo.
A turma chega, pede para eu contar uma piada e eu conto. Não é como se fosse Nico e Lau. Se você encontrar com eles na rua e pedir para contarem uma piada, eu acho que eles não irão querer contar”, explica.
O piadista relata que o processo criativo pode ser um pouco demorado, mas sempre teve essa imaginação fértil. Porém, também conta com apoio dos seus seguidores para produzir conteúdo para os vídeos. “Muitas vezes os seguidores me mandam as piadas prontas, pedem para eu contar. Se escrito a turma já gosta, imagina falando”, brinca o humorista. Boia revela que um dos vídeos que mais fez sucesso, com 160 mil visualizações, foi inspirado em um áudio que um fã enviou vendendo relógios. “No vídeo estamos eu e minha filha.
Eu passo com o relógio na mão e falo para ela: ‘quer comprar relógio?’. Ela então me pergunta: ‘mas eu posso tomar banho com ele?’ E eu respondo: ‘estou vendendo relógio, não sabonete!’”, conta em meio a gargalhadas. Outra produção que ganhou cerca de 500 mil visualizações foi uma em que ele toma banho com água e gelo.
O humorista diz que recebe muitas mensagens elogiando a forma que escolheu para fazer piadas, que não tem conteúdo violento ou sexual. “Essa semana fiz um vídeo com meu cachorro dizendo para não judiar dele. Ai uma pessoa comentou: ‘é uma forma de humor, mas ensina a não judiar dos cachorros’”. “As pessoas me reconhecem na rua e dizem: ‘seus vídeos são bons. Não tem violência e não tem besteira. Meu neto fica rindo vendo seus vídeos. É um vídeo saudável, não é de besteira”. Com isso, ele conseguiu conquistar o público infantil ao mesmo tempo em que tem fãs adultos e idosos. Victor Ostetti/MidiaNewsBoia Cuiabano se diverte ao ser reconhecido na rua
Ônus e bônus da fama
Como uma personalidade famosa, Boia é reconhecido na rua e até tira foto com os fãs. Para ele, são momentos muito divertidos que nunca imaginou que aconteceria. “Sempre sou parado na rua, tiro fotos e tudo. Me sinto famoso demais. Eu gosto. Nem conheço a pessoa, mas ela já me conhece por conta dos vídeos e fica me olhando na rua”, relata o piadista. Ele ainda disse que possui seguidores até em outros países, cuiabanos que assistem a seus vídeos para matar a saudade da terra natal.
No entanto, Boia também recebe muitas críticas em sua página. De acordo com ele, existem pessoas que vão até lá apenas para ofender e xingar. “Quando a gente posta essas coisas, já tem que estar preparado para receber críticas. Lógico que a gente não gosta muito de ler essas coisas”, afirma. Apesar disso, José Antônio já recebeu convites para fazer comerciais e agora se prepara para o primeiro trabalho no teatro. Porém, ele ainda não se considera um verdadeiro humorista, pois acredita que ainda tem muito que aprender. “Minha preocupação é ficar meio tímido ali no palco, mas vamos ver”.